Nota pastoral para o Dia Caritas 2012
{phocagallery view=category|categoryid=3|imageid=3|imageshadow=shadow3|displayname=0|displaydetail=0|displaydownload=0|displaybuttons=0|displaydescription=0|float=left|displayimgrating=0}«Edificar o bem comum: tarefa de todos e de cada um»
1. A caminhada da humanidade chama a atenção para a urgência de refletirmos sobre algumas realidades a que nem sempre temos prestado os cuidados necessários. Habituámo-nos, por exemplo, à celebração de determinados dias durante o ano, e a rotina pode impedir que os tornemos num apelo para o compromisso.
A Igreja, em Portugual, celebra todos os anos, no III Domingo da Quaresma, o Dia Cáritas como tempo de reflexão e de compromisso dos cristãos e das suas comunidades. Para tal é proposto um tema destinado a formar consciências e a motivar para as exigências da caridade.
Nestes tempos de perplexidade e de alteração do paradigma social dominante, somos convidados a refletir e a concretizar essa reflexão em gestos de partilha, sob o lema: «edificar o bem comum: tarefa de todos e de cada um». A Quaresma torna-se deste modo um período onde procuramos reconhecer que «a disponibilidade para Deus abre à disponibilidade para os irmãos e para uma vida entendida como tarefa solidária e jubilosa» (Caritas in Veritate, 78).
2. Ninguém ignora que a referência permanente à liberdade individual e à consequente autonomia de vida têm obstruído o bem comum. Com isto adia-se a construção da «civilização do amor» como verdadeira orientação alternativa, capaz de responder às necessidades camufladas com o nome de «crise».
Numa sociedade verdadeiramente evoluída, supõe-se que o Estado desempenha um papel fundamental na garantia de condições de vida condigna a todos os cidadãos. Contudo, esperar tudo do Estado é um engano irresponsável, dado que a solidariedade mais profunda radica em cada pessoa e em toda sociedade, nas suas múltiplas relações de corresponsabilidade, começando pelas relações de proximidade.
3. O Santo Padre Bento XVI afirma que «a solidariedade consiste primariamente em que todos se sintam responsáveis por todos» (Caritas in Veritates, 38). Como Igreja, teremos de adotar o espírito do Bom Samaritano, que passa nas estradas da vida e reconhece a necessidade de intervenção, através de um «coração que vê» e que atua em conformidade.
O crescente desemprego gera e agrava ambientes amargos nas famílias e na sociedade; o isolamento dos idosos conduz à solidão extrema na própria morte; e muitas famílias de todas as idades, particularmente as suas crianças, não conseguem prover às suas necessidades básicas. De tudo isto resultam graves situações de desencanto e de rutura verdadeiramente alarmantes. Em tal encruzilhada, sem saída à vista, somos interpelados a optar por um caminho diferente do passado, optando claramente pelo bem comum, sem perdermos de vista o destino universal dos bens do mundo.
4. Trata-se, por outras palavras, da opção pelo amor. «Amar alguém é querer o seu bem e trabalhar eficazmente por ele. Ao lado de um bem individual existe um bem ligado â vida social das pessoas: o bem comum. É o bem daquele «nós todos» , formado por indivíduos, famílias e grupos intermédios que se unem na comunidade social» (CV 7).
Neste Dia Cáritas, propõe-se, a todos os cristãos, uma forte consciência social e a intensificação das atividades solidárias. Recomendam-se, com alta prioridade, três linhas de ação às quais, infelizmente, não tem sido prestada a devida atenção: a primeira, respeita à existência de grupos de ação social – grupos Cáritas, conferências vicentinas ou outros – em todas as paróquias; a segunda, ao tratamento estatístico dos casos sociais acompanhados; e a terceira, à intervenção junto dos poderes públicos, sempre que necessário, para a adoção de medidas adequadas. Nas paróquias onde não existemgrupos de ação social, ou estes não integrem representantes de todas as suas zonas, não se garante a proximidade à semelhança do Bom Samaritano. Quando não se elaboram e não se difundem as estatísticas dos casos sociais acompanhados, verifica-se a respetiva ocultação pública e escasseiam as bases consistentes para a intervenção junto dos poderes públicos. Por outro lado, quando não se pratica esta intervenção, recusa-se uma atuação que, em muitos casos, é indispensável.
Ao lado destas linhas de ação, as comunidades devem ser formadas para uma cultura de responsabilidade pelos outros. Ninguém é estranho na vida do cristão e muitos problemas deixariam de existir se as respostas acontecessem em termos de proximidade, talvez no silêncio da caridade verdadeira, e com pequenos gestos de que todos são capazes.
5. Todos somos responsáveis pela construção do bem comum. É uma tarefa a que ninguém se pode eximir. Cada um de nós deve dar o seu contributo como algo insubstitível, visando sempre um humanismo integral.
Neste contexto, a Cáritas tem, diante de si, uma responsabilidade enorme de ação e animação para a resposta imediata, e de fundo, a problemas inadiáveis. Daí a necessidade do contributo, traduzido em partilha generosa, de todos os cristãos e dos cidadãos em geral; hoje e sempre.
Que este ano de austeridade gere uma maior consciencialização pelo bem comum, com a vontade expressa de o edificar quotidianamente e em todos os lugares, por todos e por cada um!
D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga,
presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana